A edição do Jornal Nacional desta segunda-feira (26) começou com um alerta de médicos e farmacêuticos sobre o uso desregrado de remédios para emagrecer. Eles advertem que muitos pacientes podem estar comprando emagrecedores manipulados de forma irregular e sem qualquer fiscalização.
Faz um mês que o mercado de novos remédios para emagrecer ganhou um novo medicamento vendido nas famosas canetas. Além da semaglutida, agora também estão nas farmácias as canetas de tirzepatida.
Mas, antes mesmo da chegada oficial, os medicamentos já estavam no mercado brasileiro também em versões manipuladas. Vendidas em farmácias de manipulação, sites e clínicas médicas.
E aí começa a polêmica. Esses são princípios ativos de remédios que ainda têm patentes valendo. Nenhum laboratório pode fabricar ou colocar na prateleira um remédio com essas susbstâncias. Por isso, não tem ainda tirzepatida ou semaglutida genéricas.
A Novo Nordisk, que criou a semaglutida, afirma que precisaria autorizar a manipulação do princípio – o que não fez – e que o que acontece no Brasil é a cópia do produto, o que caracteriza infração de patente e infração sanitária.
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Médicos e farmacêuticos alertam para a venda irregular de remédios para emagrecer sem fiscalização — Foto: Reprodução/TV Globo
O fabricante que tem a patente da tirzepatida, a Lilly, diz que “alguns vendedores de produtos manipulados estão comercializando versões de tirzepatida que nenhum regulador jamais avaliou quanto à segurança e eficácia”.
Já a Anvisa diz que não fiscaliza patentes. E que, como o princípio ativo já foi aprovado em um medicamento no Brasil, ele pode ser importado e manipulado.
“Tem que ser uma farmácia autorizada, tem que comprar esse ativo de uma importadora também autorizada pela Anvisa. Essa importadora deve fazer a sua qualificação do fornecedor. Então, uma importadora séria não vai comprar qualquer insumo ativo por aí, né? Ela tem que qualificar esse fornecedor que vai vender esse insumo ativo”, explica a assessora da área de fiscalização de medicamentos da Anvisa, Diana Nunes.
- Repórter: mas a Anvisa vai pegar esse insumo em algum momento e fiscalizar se ele é o que eles estão dizendo que é?
- Diana Nunes: Não, só em casos específicos de programas específicos para fiscalização.
- Repórter: Então só para entender: se uma empresa que é uma importadora autorizada está importando uma substância que ela chama de tirzepatida ou semaglutida, ninguém vai checar se aquilo é aquilo mesmo?
- Diana Nunes: Estamos falando de empresas autorizadas, né? Uma vez que ela é uma empresa autorizada, se ela tiver cometendo esse tipo de infração, ela vai ser penalizada.
Para a Associação da Indústria Farmacêutica, essa fiscalização precisa melhorar. O presidente da Interfarma diz ainda que remédios só podem ser manipulados sob demanda específica, quando existe uma necessidade individual, como uma pessoa que precisa de uma dosagem diferente de um remédio que está no mercado. Mas o que está acontecendo no Brasil é a fabricação de medicamentos manipulados em massa.
“O produto fabricado pela farmácia de manipulação não é feito qualquer teste nesses produtos finais. Testes que vão comprovar concentração, testes que vão comprovar, no fim do dia, a qualidade e a segurança desses produtos. Como é feito nos medicamentos em escala industrial. Nós podemos estar diante de um medicamento que pode não ter efeito, ou um medicamento que tenha outro efeito, ou um medicamento que cause, de fato, danos. Então é preocupante”, afirma o presidente-executivo da Interfarma, Renato Porto.
Essa permissão de manipulação, que deveria ser só pra casos específicos, ainda acaba sendo usada como argumento de legitimidade para quem faz tudo errado. Esses remédios só podem ser vendidos por farmácias ou drogarias. Não por perfis em redes sociais.
“As agulhinhas pra aplicação. E eu envio também as orientações para primeira aplicação”, diz uma mulher em um vídeo publicado nas redes sociais.
Essa massificação de remédios sem origem garantida muitas vezes virou uma pergunta sem resposta no consultório do vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos da Obesidade.
“Recebemos pacientes, às vezes, que contam que usaram alguns desses medicamentos e falam sobre efeitos colaterais e perguntam se pode ser. E eu não tenho nem como responder para esse paciente se, de fato, aquele efeito que ele sentiu é daquilo que ele usou, porque eu não sei o que ele usou?”, conta o vice-presidente da Abeso e diretor do Departamento de Obesidade da SBEM, Bruno Halpern.
Em nota, a Anfarmag – associação que reúne as farmácias de manipulação – reforçou que os medicamentos manipulados precisam ser individualizados e vendidos com prescrição médica. E destacou a importância dos órgãos de fiscalização para coibir práticas indevidas.